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PARA ALÉM DO GREAT RESIGNATION E DO QUIET QUITTING

  • 31/10/2022
  • Carla Furtado, para Mundo RH

Como docente em Psicologia Positiva, é claro que me alegra ensinar felicidade. Mas, em meu outro papel como pesquisadora científica em saúde mental do trabalhador, vejo o quanto é urgente priorizarmos algumas conversas dentro das organizações. Sim, precisamos falar do mal-estar se desejamos, verdadeiramente, constituir ambientes de trabalho seguros, saudáveis e sustentáveis. E o governo americano entendeu isso muito bem.

Acaba de ser publicado um documento intitulado "Surgeon General's Framework for Mental Health & Well-Being in the Workplace", um modelo de promoção da saúde mental e do bem-estar no ambiente de trabalho assinado pelo porta-voz da saúde pública nos Estados Unidos, o médico Vivek Murthy. A justificativa é óbvia, fenômenos como The Great Resignation ou Grande Demissão e o Quiet Quitting ou Desistência Silenciosa evidenciaram severos problemas nos ecossistemas organizacionais. As pessoas simplesmente não querem permanecer.

O modelo americano merece muita atenção de nós, brasileiros. Isso, por duas razões: primeiro porque apesar das distinções entre as duas economias, há espelhamento no comportamento de parte dos trabalhadores brasileiros, em especial aqueles que têm condições de decidir se desligar ou permanecer sem grandes esforços no emprego. O segundo ponto é a organização de elementos que são trabalhados no Brasil, mas na maioria das empresas de maneira não sistematizada.

O documento traz cinco pilares: Proteção Contra Danos, Conexão e Comunidade, Harmonia Trabalho-Vida, Reconhecimento, Oportunidade de Crescimento. E, ao centro, destaca os elementos Voz do Trabalhador e Equidade. Em 30 páginas, fundamenta a transformação que se faz urgente nos ambientes de trabalho, sob pena de vermos crescer os já alarmantes números dos transtornos mentais e comportamentais e seus consequentes impactos nas famílias, nas empresas e na economia.

No primeiro pilar, Proteção Contra Danos, o framework preconiza a criação de condições para a segurança física e psicológica como bases fundamentais para a saúde mental e o bem-estar no local de trabalho. No pilar Conexão e Comunidade destaca a criação de culturas de inclusão e pertencimento e enfatiza, também, a relevância da confiança e da colaboração entre pares e em equipes. Em Harmonia Trabalho-Vida trata do que, a meu ver, é a ferida exposta no momento no mundo corporativo: autonomia no trabalho, flexibilidade nos horários e respeito ao tempo de repouso e restauração. No quarto pilar, Reconhecimento, traz salários dignos, gestão participativa e cultura de gratidão e valorização. Por fim, em Oportunidade de Crescimento, destrincha as condições necessárias ao desenvolvimento pessoal e de carreira.

Estamos quase às vésperas de 2023, momento propício para que a saúde mental do trabalhador seja inserida nas estratégias mais relevantes para o próximo ciclo. Minha recomendação é que ela ingresse, em definitivo, no portfolio estratégico, no escopo da gestão de riscos e na agenda ESG das corporações.


Carla Furtado é pesquisadora científica na Universidade Católica de Brasília, professora na PUCRS e no Hospital Israelita Albert Einstein e diretora do Instituto Feliciência.

Artigo originalmente publicado no portal Mundo RH



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