Estado de Minas destaca participação da professora Carla Furtado em evento realizado no último fim de semana em BH, a convite da FIEMG, do SEBRAE e do IEL.
Quando comecei a estudar Segurança Psicológica a partir da teoria estabelecida pela professora Amy Edmondson, da Harvard Business School, percebi que já havia estado ali. Sim, apesar de toda formação e de uma atuação acadêmica e corporativa dedicada à felicidade, já havia sofrido as consequências de estar em um ambiente psicologicamente inseguro. Por questões éticas, não vou identificar as circunstâncias, apenas reafirmar que em contextos dessa natureza deixamos de ser quem somos para nos preservar.
Segundo Edmondson, segurança psicológica é a crença compartilhada pelos membros de uma equipe de que o ambiente social permite que se assuma riscos interpessoais: as pessoas sentem-se confortáveis para propor novas ideias sem serem julgadas, sentem-se seguras para mudar de ideia ou discordar e sabem que está tudo certo em correr riscos pois a cultura de feedback contínuo facilita a correção de rota.
O resultado é óbvio: em ambientes psicologicamente seguros profissionais e times alcançam performance superior. E a Google sabe disso. Com o chamado "Projeto Aristóteles", acompanhou 180 de seus times durante 2 anos para identificar "o que constrói uma equipe perfeita". O estudo estabeleceu como principal componente a segurança psicológica. "Os membros de uma equipe se sentirão psicologicamente seguros quando compartilharem a crença de que não serão expostos a ameaças interpessoais ou sociais a eles próprios, sua posição social ou sua carreira", descreve o estudo.
O Aristóteles trouxe ainda uma constatação: a segurança psicológica diferiu enormemente entre as equipes, estando associada, em menor ou maior grau, aos diferentes perfis de liderança da companhia. Isso trouxe clareza quanto à necessidade de se estabelecer uma cultura organizacional de segurança psicológica, com capacitação e estímulo para que os gestores de todos os níveis hierárquicos cocriem, nutram e encorajem sua prática.
A insegurança psicológica está muitas vezes por trás de prejuízos monumentais porque, para evitar se expor, colaboradores se calam diante de riscos iminentes. Basta trazer à mente acidentes de grande impacto envolvendo organizações renomadas, esses acidentes costumam ser multifatoriais e parte das variáveis foi identificada por indivíduos ou equipes anteriormente. A cultura do silêncio é responsável pela queda de ações, pela evasão de recursos, pela perda de clientes e, em casos extremos, pela perda de vidas.
Já a segurança psicológica é um fator associado ao sucesso de um negócio. A empresa de animação digital Pixar afirma que uma de suas práticas de sucesso é proteger as ideias para novos filmes ou o que chamam de "ugly babies" (bebês feios, em tradução livre). A Pixar acredita que críticas precoces podem interromper o processo criativo e que todo blockbuster um dia foi um "bebê feio". Contudo, o excesso de positividade pode ser igualmente ruim, pois há um momento no qual é necessário estabelecer feedback honesto para identificar problemas e ajustar o percurso. Tanto a proteção de ideias iniciais quanto o feedback demandam um ambiente dotado de segurança psicológica. Como resultado, a companhia acumula dezenas de premiações, entre Oscars, Globos de Ouro e Grammy Awards.
Há quem ainda chame nosso tempo de VUCA - acrônimo inglês para volátil, incerto, complexo e ambíguo. Há os já adeptos do novíssimo mundo BANI - também do inglês: frágil, ansioso, não-linear e incompreensível. A verdade é que um acrônimo é pouco para descrever a Era da Complexidade, na qual uma única variável para um sistema e sabemos bem disso após a pandemia. Organizações são mais resilientes quando fomentam diversidade, equidade, inclusão e pertencimento. E, para isso, segurança psicológica é requisito básico.
*Carla Furtado é pesquisadora científica e professora na área de psicologia e fundadora do Instituto Feliciência, com atuação no Brasil e em Portugal