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O QUE SIGNIFICARÁ SER FELIZ EM 2022?

  • 28/12/2021
  • Carla Furtado, para Estadão

A pergunta que mais ouço é 'Como ser feliz em um mundo tão complexo?'. Sorte a minha que Aristóteles a respondeu há cerca de 2.300 anos e bebo no pensamento do filósofo para sustentar a resposta: podemos ser felizes a partir de nossas virtudes e da excelência - do grego, língua nativa de minha mãe, daemon e areté. A essa abordagem foi dado o nome de eudaimonia.

Nunca foi tão relevante refletir sobre o pensamento aristotélico, no qual não se vislumbra a felicidade a partir de uma postura meramente autocentrada. A virtude, para o filósofo, versava sobre o que há divino em cada um de nós e de que forma esse divino reverbera para além de nós mesmos. Hoje, na psicologia, falamos sobre forças de caráter, aquilo que se manifesta em nós de maneira natural, que nos constitui, e causa impacto positivo em nosso meio. A felicidade não é mesmo autocentrada, o nome disso é egoísmo.

As neurociências já evidenciaram que o filósofo helênico estava certo: somos mais felizes quando somos legitimamente pró-sociais. Entre as habilidades para a felicidade, a generosidade desponta no topo do ranking, ou seja, somos beneficiados quando somos bondosos, empáticos, compassivos, altruístas. Mas, que ninguém tente fazê-lo para obter benefícios: pode-se enganar os outros, contudo é impossível trapacear com o próprio sistema nervoso, ele reconhece quando se é gentil esperando algo em troca. A felicidade não se constrói com barganhas.

Sobre a excelência, também mencionada nos escritos de Aristóteles, nunca foi sobre perfeição. Sempre foi sobre fazer o melhor que se poder fazer com as condições que se tem. Buscar perfeição em meio a maior crise sanitária do nosso tempo é um caminho para frustração e infelicidade. Não custa lembrar: vida não é um concurso nem de sucesso, nem de afluência material, nem de beleza e nem de juventude. Não há pódio para a felicidade.

Contudo, mantendo a coerência com o que o filósofo ensinava em seu Liceu de Atenas, esteja atento ao fato de que a felicidade não é para os inertes, é para os ativos. Dá mesmo trabalho conferir sentido à vida e vivê-la, dia após dia, a partir das próprias virtudes e não dos vícios. E fazê-lo de maneira equilibrada, pois mesmo as virtudes em excesso se tornam malefícios. Mas, esse é o trabalho que compensa os esforços. Afinal, que ninguém acredite que uma vida esvaziada de sentido é uma experiência fácil.

Desejo que em 2022 você se aproxime da felicidade ordinária, em vez de buscá-la no extraordinário. E que, ao olhar para 2021, com todos os seus desafios, o pensamento de outro filósofo, Santo Agostinho, lhe invada: "Felicidade é seguir desejando aquilo que já se possui". Este ano, experimente trocar a lista de desejos pela lista de agradecimentos.  

Carla Furtado é pesquisadora científica, professora na área de psicologia e fundadora do Instituto Feliciência.

Acesse aqui o artigo publicado no Estadão



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